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31.1.03



Danças do Porão, com o JOÃO SALDANHA (não é homônimo, é filho do outro famoso Saldanha também João) e a PAULA NESTOROV, foi escolhido entre os 10 melhores espetáculos de dança do ano passado, está saindo de cartaz neste final de semana. Portanto, fique esperto. Amanhã às 19 hs e no sábado e domingo às 17 hs. no Paço Imperial, Sala dos Archeiros. Entrada GRATIS. Senhas uma hora antes. Não vá ou se arrependerá para sempre...

Uma dica de exposição, aproveitando a sua ida ao Paço Imperial é A IMAGEM DO SOM DO ROCK-POP BRASILEIRO. Oitenta artistas visuais, interpretando cada um uma composição. Muito interessante e divertido. Vá lá pagar o seu mico. Eu comecei rindo do mico dos outros, e quando me toquei eu também estava pagando o meu . Como uma onda no mar do Lulu Santos, na interpretação visual de Brígida Baltar, Gita de Abraham Palatnik e Maracatu Atômico de Rosa Magalhães são os meus preferidos. Tem alguns bem fraquinhos, mas a grande maioria pegou a música que lhe coube nesse latifundio, e mandou bem. (Latifundio, porque não? Minha homenagem ao Chico Buarque -- tô com essa música na cabeça, e ao João Cabral de Melo Neto para não dizer que eu quasi perdi o fio da trilha). Pretendo voltar porque ví no mesmo dia em que eu fui ao espetáculo do João e da Nestorov. A exposição fica no Paço Impérial, no segundo pavimento, de terça a domingo das 12 às 18 horas, até o dia 16 de março. Entrada franca.

27.1.03

* A programação desse " Ferestival " do LUME está imperdível - desde o próprio repertorio do grupo com alguns dos seus melhores trabalhos como "Café com queijo" e os numeros de clown do Ricardo Pucetti, aos convidados do Rio, o Teatro de Anonimo "In concerto" e o brinquedo de teatro popular do Marcio Libar "O Pregoeiro", o trabalho
solo da atriz, professora e pesquisadora Juliana Jardim em "Madrugada" e o Grupo O Pedras com "Restrin". Eu assisti todos esses espetáculos aqui no Rio, sendo alguns mais de uma vez. Quanto aos outros trabalhos da programação eu tenho as melhores referências. Se não as tivesse recomendaria do mesmo jeito porque uma apresentação lá na sede do LUME, é por si só uma garantia de qualidade.


I FERESTIVAL TEATRAL DO LUME

Iniciando nossas atividades e parcerias para o ano de 2003, e aproveitando a
presença de 90 pessoas provenientes de todo o Brasil e de países como EUA,
CANADÁ, ARGENTINA, DINAMARCA, PERU e BOLIVIA que estarão em Barão Geraldo participando de nossos workshops gostaríamos de convidá-lo a participar do 1º FEVERESTIVAL TEATRAL que acontecerá no Espaço Cultural SEMENTE (Av. Sta Izabel, 2070 - próxima a Moradia dos Estudantes da UNICAMP) Agora com estacionamento próprio.

WORKSHOP DE ACROBACIAS AÉREAS - Com integrantes do NAA (Núcleo de Acrobacias
Aéreas)
Local: Espaço Cultural Semente
Período: De 27/01 a 01/02
Horário: das 09:00 às 12:00 h
Vagas limitadas
Investimento: R$100,00 (50% no ato da inscrição até dia 25/01)
Informações e inscrições:
96047914 / 32491581 ou espacosemente@yahoo.com

WORKSHOP DE CLOWN COM PEPE NUNES (CLOWN ESPANHOL)
Local: Espaço Cultural Semente - Barão Geraldo - Campinas
Período: 01 a 04/02/03
Horário: das 14:00hs às 18:00hs
Vagas: 14
Preço: R$150,00 (50% no ato da inscrição até dia 25/01)
Preferência aos 14 primeiros inscritos. Não haverá seleção.
Informações e inscrições: (19) 3289 2069 (Joana), (19) 3289 9869 (Barbosa)
ou pelo e-mail: espacosemente@yahoo.com


Enviamos abaixo a grade de datas e horários dos espetáculos. Maiores
informações pelo telefone (19) 3289 2069 com Joana e (19) 3289 9869 com
Barbosa.
O valor dos ingressos para os espetáculos será de R$10,00 (inteira) e R$5,00
(meia).
Para as Demonstrações Técnicas e Palestras (Terças feiras) a entrada é
FRANCA.

DIA 03/02 - Segunda feira - Horário- 21:00 h
Espetáculo- PIC NIC
Com Pepe Nunes (Espanha)

DIA 04/02 - Terça feira - Horário: 23:00 h
DEMONSTRAÇÃO TÉCNICA SOBRE OS TRABALHOS DO LUME
Carlos Simioni (Lume)

Dia 05/02 - Quarta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo - O PREGOEIRO
Trabalho solo de Marcio Libar
Teatro de Anônimo - RJ

Dia 06/02 - Quinta feira - Horário: 23:00 h
Espetáculo - IN CONCERTO
Teatro de Anônimo - RJ


Dia 07/02 - Sexta feira - Horário- 23:00 h
Espetáculo - PIC NIC
Com Pepe Nunes(Espanha)

Dia 08/02 - Sábado - Horário: 21:00 h
Espetáculo - CNOSSOS
Com Ricardo Puccetti (Lume)

Dia 09/02 - Domingo - Horário: 20:00 h
Espetáculo - MADRUGADA
Com Juliana Jardim (RJ)


Dia 11/02 - Terça feira - Horário: 23:00 h
Palestra com Tiche Vianna (Barracão Teatro)

Dia 12/02 - Quarta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo: INSTRANGEIRA (Projeto Solos do Brasil)
Com Tiche Vianna (Barracão Teatro)

Dia 13/02 - Quinta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo: CAFÉ COM QUEIJO
Com o grupo Lume

Dia 14/02 - Sexta feira - Horário: 23:00 h
Espetáculo: CAFÉ COM QUEIJO
Com o grupo Lume

Dia 15/02 - Sábado - Horário: 21:00 h
Espetáculo: O ACROBATA
Com o grupo Seres de Luz

Dia 16/02 - Domingo: Horário: 20:00 h
Espetáculo - RESTRIN
Com o grupo O PEDRAS (RJ)


Dia 18/02 - Terça feira - Horário: 23:00 h
Palestra com Renato Ferracini (Lume)

Dia 19/02 - Quarta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo: ODISSI (Dança Indiana)
Com o grupo Locômbia (Colômbia)

Dia 20/02 - Quinta feira - Horário 21:00 h
Performance Clownesca - O SAPO (Naomi Silman - LUME)
Performance Clownesca - ESPATÓDIA (Silvia Leblon - SP)

Dia 21/02 - Sexta feira - Horário: 23:00 h
Espetáculo: O TRIÂNGULO (SP)
Direção de Esio Magalhães (Barracão Teatro)

Dia 22/02 - Sábado - Horário: 21:00 h
Espetáculo: CUANDO TU NO ESTÁS
Com o grupo Seres de Luz

Dia 23/02 - Domingo - Horário: 20:00 h
Espetáculo: CRAVO, LÍRIO E ROSA
Com Carlos Simioni e Ricardo Puccetti - LUME

Dia 25/02 - Terça feira - Horário: 23:00 h
Demonstração técnica de CLOWN com Ricardo Puccetti
Grupo Lume

Dia 26/02 - Quarta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo: MARIA, MARIA
Com o grupo Arrastão de Teatro

Dia 27/02 - Quinta feira - Horário: 21:00 h
Espetáculo: JOSEFINA
Com o grupo Boa Companhia

Dia 28/02 - Sexta feira - Horário: 23:00 h
Espetáculo: LA SCARPETTA
Com Ricardo Puccetti - Lume


LUME
Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas Teatrais COCEN - UNICAMP
Tele/Fax: (19) 3289 9869
E-mail: lume@unicamp.br
Home-Page: www.unicamp.br/lume

25.1.03

Figuração inteligente nos anos de chumbo

A propósito da minha aversão aos espetáculos de ópera, tem um fato relacionado, do qual eu gosto de lembrar, apesar de tudo. Anos 1970, AI5 vigorando firme e forte: censura a mil, bombas explodindo dentro dos teatros, censura nos espetáculos e nos textos teatrais, e na TV, aquele micão pela censura ao filme do Ballet Bolshoi, proibido de passar na TVE. Tempo de vacas magérrimas. Sobreviver de teatro nesse País, nunca foi fácil, e especialmente àquela época, era um ensaio diário de malabarismo, saltos, quedas, rolamentos e o delicado equilíbrio na corda bamba que se constitui o exercício da nossa profissão. No palco e na vida real, qualquer descuido poderia ser fatal, com a repressão atenta à vida pessoal dos artistas e às suas performances artísticas. Nesse jôgo de cintura nosso de cada dia, a gente descolava uns cachêzinhos naquilo que aparecesse para fazer no palco -- até figuração em ópera do Teatro Municipal. Fiz algumas, e defendi uma graninha muito bemvinda no chamado anos de chumbo.

Essa minha atuação como figurante inteligente teve o seu comêço quando numa noite, eu estava com uma galera de teatro no Bar Amarelinho, na Cinelândia, e adentrou nesse recinto, um produtor ligado ao Teatro Municipal, procurando jovens atores e atrizes para trabalhar, fazendo figuração inteligente numa ópera com estréia marcada no Teatro Municipal. Eramos todos muito jovens, em início de carreira, com o dinheiro contado para uma água mineral ou um refrigerante e um prato de batatas fritas sendo dividido entre seis ou mais pessoas, era tudo quanto o nosso dinheiro permitia. E é claro que aceitamos, e êsse foi o início de uma longa série de figuração inteligente, isto quer dizer, o ator que não tem texto, e só faz caras e bocas, reagindo às falas dos outros. E em alguns casos, só precisavamos comparecer no dia da estréia para o ensaio geral, e atuar á noite no espetáculo.

Numa dessas apresentações, era uma estréia complicada e o ensaio geral própriamente dito, resumiu-se a uma marcação de luz no palco, entradas e saídas, posicionamentos no palco, mas sem os figurinos e sem as falas e as cantorias. Á noite, na hora do espetáculo, no momento marcado, entramos nós os atores da figuração inteligente, e logo após, o cantor principal -- um ármário de dois metros de altura, que víamos e ouvíamos pela primeira vez na vida. E esse gigante balofo, se encaminha ao centro do palco, estufa o peito imenso, faz uma cara estranha, e solta o vozeirão num estrondo estarrecedor. Aquele gigante com aquele figurino que ele mal cabia dentro, aqueles gestos, falsos, super representados e aquela voz empostada, além de grotesco era muito engraçado. A custo eu segurei o riso, e nem ousei olhar na direção dos meus colegas.

E para completar a nossa tortura, o gigante canta ainda naquele seu estilo prá lá de peculiar, um bom tempo, enquanto surgem outros engraçados personagens cantores super empostados e falsos. E por último, a heroina -- uma loura grandalhona com um figurino ridículo, uma voz esganiçada, soltando um grito muito esquisito, ao mesmo tempo que corre para o gigante, pisa na barra do próprio vestido, quase caindo, mas equilibrou-se a tempo. E nós, ali de figuração inteligente, assistindo aquela cena patética, e sem poder rir. Ao final do espetáculo, depois dos agradecimentos, nunca saimos tão rápido de um palco. Fomos todos nós da figuração inteligente, direto aos camarins para rirmos tudo o que tínhamos direito. Até hoje eu rio quando lembro da cena. No dia seguinte, a mesma comédia. Mas dessa vez foi mais fácil segurar o riso porque já conhecíamos as performances desses estranhos personagens.
Em tempo: não era uma ópera bufa, mas uma ópera romântica e trágica. Não lembro o nome da ópera e nem a proveniência do espetáculo. Enfim, era uma dessas " pérolas " que o Municipal costumava importar do estrangeiro.
Tosca by Tebaldi

Há três dias, eu escuto direto, a qualquer hora do dia, da noite, da madrugada, o lado B do disco (made in England, no velho e bom vinil) Operatic recital by Tebaldi, repetindo ad infinitum a terceira faixa, onde ela interpreta uma área da Tosca, de Puccini, Vissi d'arte, vissi d'amore -- I have lived for my art and for love, and never harmed a living soul . Esse ritual é repetido sempre que eu ouço esse disco. Essa área me emociona, e é para mim, a melhor interpretação da maravilhosa Renata Tebaldi nesse disco, em que ela canta ainda de Puccini, " Madame Butterfly" e "Manon Lescaut". E de Verdi a " Aida" e "Il trovatore", e duas áreas de " Faust ", de Gounod.

E hoje eu descobri aqui numa pesquisa que a Tosca foi produzida por Puccini, em 1900, baseada num drama escrito por Sardou (Belo Britto quem é esse Sardou?) para a divina Sarah Bernhardt. Tá explicado. E a Tebaldi arrasa. E pensar que eu não gostava de ópera. Nenhuma. Êsse genero artístico não fazia a minha cabeça. Sergio Britto (o ator), um aficcionado e profundo "conaisseur" de ópera vai gostar de saber que eu mudei de idéia. Aliás, não mudei de todo.

Nem Tanhäuser...

Continúo não gostando nada dos espetáculos de ópera. Ópera, só para ouvir. No ano retrasado, ganhei convites para assistir Tanhauser de Richard Wagner, (amo a abertura dessa ópera, e não me canso de ouvir) no Municipal numa montagem internacional dirigida por um diretor de teatro, alemão (esquecí o nome dele, agora), e considerada uma montagem de vanguarda, minimalista, aclamadíssima internacionalmente, etc. e tal, e não gostei. O espetáculo era muito bonito, com aquelas imensas cortinas brancas voando pelo palco, contrastando com os figurinos todos vermelhos, mas sòmente os primeiros minutos e depois cansava aquela repetição, sem mudar nada dquele cenário todo branco. Minimalismos, á parte, a ópera tem partes muito monótonas, e eu dormi quasi todo o espetáculo. ( Alguns amigos vão me odiar por causa desse post). Ah, e um detalhe não me escapou: os figurantes eram péssimos, inexpressivos, entravam e saim nas horas erradas. Figuração inteligente, não é para qualquer um. Tem que ser suficientemente artista. Sobre isso vou postar depois aqui uma historinha pessoal retirada do fundo do meu baú da memória.

22.1.03


Dramaturgia brasileira em Londres

Seis textos participam da primeira mostra brasileira de dramaturgia promovida pelo Royal Court Theatre, a mais tradicional instituição européia de incentivo à dramaturgia no mundo. Destaquei esta notícia pela sua atualidade,no momento em que estão acontecendo vários encontros no Rio e em São Paulo para discutir a dramaturgia brasileira, conforme a matéria do Jornal do Brasil, de terça-feira passada. Além disso, foi iniciado um debate lá no Forum de Teatro com o Dinho Valladares e a Isis Baião. Isso vai render. E essa notícia aqui no Estadão contraria os prognosticos mais pessimistas sobre a falta de autores, e mesmo de oficinas de dramaturgia.

São Paulo - New Plays from Brazil (Novas Peças do Brasil) é o título da primeira mostra de dramaturgia brasileira em Londres, promovida pelo Royal Court Theatre, a mais tradicional instituição européia de incentivo à dramaturgia no mundo. De 16 a 20 de janeiro de 2003, será realizada mostra de leituras dramáticas, em inglês, de seis peças produzidas em São Paulo e Salvador, acompanhadas de debates, com a presença dos autores selecionados. E não faltará um viés folclórico: um workshop de samba e apresentações de MPB e música afro-baiana estão na programação. O evento resulta da presença do Royal Court Theatre no País, desde 2001, com o apoio de parceiros como o British Council (Conselho Britânico), o Centro Cultural São Paulo e o Teatro Vila Velha, de Salvador.

Os autores selecionados são
Beatriz Gonçalves "Esvaziamento",
Pedro Vicente "Random" e Celso Cruz "Sete Vidas de Santo", de São Paulo; Cacilda Povoas "O Muro", de Salvador;
e Marcos Barbosa "Braseiro e Quase Nada", de Fortaleza.

As seis peças nasceram durante os workshops ministrados por diretores do Royal Court em São Paulo e Salvador. O Royal Court Theatre, criado nos anos 50, é das mais importantes instituições do mundo no desenvolvimento do teatro de autor, e, desde 1989, colabora com novos diretores e dramaturgos de vários países. Dois dos autores selecionados, Marcos Barbosa e Beatriz Gonçalves, também participaram do Residência Internacional, promovido anualmente pela instituição, congregando autores emergentes da África, Ásia, Europa e América do Sul.

Por e-mail, de Londres, a diretora internacional do Royal, Elyse Dodgson, disse que um dos critérios para a seleção (entre cerca de 16 peças participantes) foi "refletir a diversidade de temas e formas". Elyse destaca que este é o primeiro evento exclusivamente brasileiro promovido pelo Royal. A mostra de dramaturgia integra o projeto Dramaturgos Internacionais, que já incluiu França, Alemanha, Espanha e Rússia, antes do Brasil.

Ao contrário do que chamamos no Brasil de ´processo colaborativo´, em que autor, diretor e atores se reúnem na sala de ensaio buscando a excelência do espetáculo, no Royal, há uma sinergia em torno do texto teatral, diz Beatriz Gonçalves, que em "Esvaziamento" mostra as conturbadas relações de amizade e amor entre dois casais. Bia conheceu métodos de trabalho, testou cenas na sala de ensaio e participou de encontros com autores de textos montados no Brasil, como Patrick Marber (Mais Perto) e David Hare (Ponto de Vista).

O maior ganho que esse evento pode nos trazer é o reconhecimento da qualidade da produção dramatúrgica brasileira por uma instituição desse porte, opina o jovem dramaturgo cearense Marcos Barbosa, de 25 anos, selecionado com as peças Braseiro e Quase Nada. Cansa-me ler notas de jornal atestando que este ou aquele ator ou diretor brasileiro foi para os EUA ou Europa à procura de textos para montar. Se o evento servir para mudar essa prática, o ganho já será imenso.

O coordenador cultural do British Council no Brasil, Stephen Rimmer, destaca que o projeto continuará em 2003, possibilitando o acesso de mais dramaturgos brasileiros às técnicas e idéias do Royal Court Theatre. Rimmer acredita que serão priorizados os jovens autores. Também confirmou mais um parceiro brasileiro no projeto, o Sesi. "No Centro Cultural, serão ministradas as oficinas para os autores e, no Sesi, deverão ocorrer as oficinas para diretores e as montagens dos textos." Rimmer ressalta que o número de participantes do workshop poderá aumentar de 10 para 25 participantes.



Por onde anda a nova dramaturgia?

Projeto com textos de novatos abre espaço para discussão sobre escassez de autores contemporâneos

Alexandre Werneck e Cláudia Amorim (Reporteres do JB)

Entre as montagens que ocupam os teatros da cidade em busca do grande público, multiplicam-se textos importados, adaptações de clássicos e cânones como Nelson Rodrigues, mas uma ausência chama a atenção de quem procura ver no palco um retrato da atualidade escrito por alguém que efetivamente viva aqui e agora. Onde estão os autores teatrais contemporâneos? Há quem diga que o sumiço é culpa dos diretores, outros acham que os textos produzidos é que são ruins mesmo, e culpam a falta de escola e de incentivo. Uma iniciativa que pretende tirar a classe do limbo, o projeto Nova Dramaturgia Carioca, acontece até 17 de fevereiro no Teatro do Jockey. Depois da palestra de abertura, realizada ontem, com o dramaturgo Bosco Brasil, estréia hoje O homem que era sábado, um dos seis espetáculos que fazem parte da mostra.
Um dos responsáveis apontados pelo desaparecimento dos novos dramaturgos é a chamada era dos encenadores, que dominou os anos 90 com uma hegemonia de diretores de teatro que apareciam mais até do que os textos que montavam.

- Isso foi um equívoco. O diretor pode ser um grande encenador, mas um péssimo dramaturgo. O ideal é o equilíbrio: bom texto e bom diretor - diz o crítico de teatro e imortal da Academia Brasileira de Letras Sábato Magaldi, acostumado a altos e baixos na dramaturgia brasileira em 75 anos de vida.

O autor Bosco Brasil, destaque (tardio) na cena teatral carioca no ano passado com Novas diretrizes em tempos de paz, vê um arrefecimento dessa ditadura dos diretores:

- As pessoas se tocaram de que o dramaturgo é uma figura importante. Era impressionante: o espectador de televisão tinha mais noção do autor do que o de teatro.

O dramaturgo Domingos de Oliveira pensa diferente. Para ele, os novatos na arte de escrever para teatro não foram vítimas de encenadores e diretores, mas sim de seus textos sem qualidade:

- Está brabo. Procuro muito, não me recuso a ler nada, mas não aparecem bons textos. O problema é que é muito difícil escrever e não existe curso ou apoio à dramaturgia nacional. Devia haver um prêmio, não dá para escrever peças nas horas vagas.

Domingos, que cita algumas exceções em meio à crise na dramaturgia nacional (entre elas, Bosco Brasil) é contestado por Pedro Brício, que participa do Nova Dramaturgia Carioca com O homem que era sábado, sua primeira peça como autor.

- Ter uma escola seria ótimo, mas não é absolutamente necessário. Incentivos também seriam bem-vindos: assim como há um interesse na cinematografia nacional, deveria haver na dramaturgia nacional, mas não se pode colocar a culpa nisso. Quem quer, escreve. Existem bons textos, mas ficam escondidos - acredita.

O novo dramaturgo Roberto Alvim, um dos coordenadores do Nova Dramaturgia Carioca, não só acredita que o vilão é a ditadura do encenador como não hesita em decretar sua morte.

- Ela acabou por um único motivo: os diretores não têm mais nada a dizer. A prova é que as mostras de novos dramaturgos têm feito sucesso - acredita.

Alvim coordena, desde agosto de 2001, o projeto Nova Dramaturgia Brasileira, sediado na Sala Paraíso do Teatro Carlos Gomes, sob os auspícios da prefeitura do Rio. O projeto já recebeu mais de 360 textos de diferentes autores de todo o Brasil e, em 2002, promoveu 28 leituras e encenação de 20 peças.

- Há muita gente escrevendo, o problema é que eles não têm visibilidade. Em São Paulo, como já há projetos mais antigos, isso está melhor, mas o Rio começa a se mobilizar - afirma Roberto Alvim.

Bosco Brasil concorda, apontando como problema a separação entre os autores novos e o establishment:

- Dramaturgos nunca deixaram de existir. Esses novos na verdade trabalham há muito tempo. O que se está recuperando é a auto-estima da dramaturgia brasileira.


O porto seguro dos clássicos


De fato, a montagem de trabalhos de autores novos se dá quase que invariavelmente em espaços alternativos, não chegando a grandes teatros, dominados pela tríade peças estrangeiras, clássicos e encenações dos brasileiros tradicionais.
- O ambiente de teatro tem uma relação difícil com os escritores. Repete-se o mito de que é melhor encenar uma peça de um autor morto porque ele não vai dar palpites - diz Bosco.

E tomem-se reencenações de Nelson Rodrigues.

- Essas remontagens demonstram covardia. É por esse medo que se escuta tanto que determinado texto clássico ''é tão atual'' em vez de se criarem peças de fato atuais - critica Roberto Alvim.

Mas quantos bons autores existem no meio de 360 textos como os do Nova Dramaturgia Brasileira?

- Qualidade vem com quantidade. É preciso haver muitos autores para que haja um grande número de ruins, um razoável de bons, um pequeno de excelentes e um ou dois gênios. O projeto é para manter as pessoas escrevendo - explica Roberto.


A nova escrita dramatúrgica

Tendência dos autores é elaborar o texto em equipe durante a criação do espetáculo

Macksen Luiz (Crítico do JB)

A insatisfação parece não mais redundar no silêncio. A produção dos novos dramaturgos brasileiros começa a deixar as telas dos computadores para chegar ao palco, confirmando que há um movimento de acomodação de camadas dramatúrgicas que pode vir a compor uma geologia autoral renovada. Seminários e mostras de dramaturgia, especialmente em São Paulo, e agora no Rio, procuram registrar esse ruído que reverbera como tentativa geracional de ocupar lugar um tanto abandonado desde os anos 80.

O projeto teatral Ágora, que reúne há três anos em São Paulo atores, diretores e autores em torno de investigação nas áreas cênicas, encena espetáculos que resultaram de seminários realizados em 2001. A proposição de temas, na verdade, perguntas, sugeriu a um núcleo de autores respostas dramatúrgicas que respeitaram não só a provocação temática como o limite de duração das peças, que precisam ser curtas. Simples, com traços de crônica, muitas vezes, o resultado são monólogos, gênero perigoso pela forma dramaticamente reducionista como vem sendo tratado por interpretações equivocadas.

A Mostra de Dramaturgia Contemporânea, que se realizou ano passado em São Paulo, encomendou a 15 autores peças sem limitação temática, apenas restritas a no máximo quatro atores e com até 40 minutos de duração. Tais condicionantes, que a princípio parecem restritivos em conseqüência das condições de produção - o centro de criação da nova dramaturgia nacional tem sido determinado, em grande parte, por essa economia de meios - resultam em concentração expressiva que, de certo modo, depura excessos e reforça a necessidade de núcleo dramático sólido.

A alternativa de linguagem de uma ''dramaturgia cênica'' amplia o campo da escrita teatral ao propor que o texto acompanhe, em paralelo e no conjunto da cena, o processo de criação do espetáculo. O grupo (atores, encenador, equipe técnica, autor) é responsável pela gênese do texto, coletivizado através de discussão extensiva e da incorporação progressiva de elementos trazidos por todos durante o trabalho. O processo de ensaio é, praticamente, paralelo à confecção do texto. Fernando Bonassi escreveu com o Teatro da Vertigem o memorável Apocalipse, demonstração mais bem acabada desse tipo de dramaturgia no Brasil.

Numa linha um tanto semelhante, Dionísio Neto (Opus profundum) é um autor que se distribui pela cena, também como ator e diretor, concentrando em si todas as atividades num teatro que se pretende multimídia e próximo do que poderia se definir como ''cultura pop''. A tentação de se enquadrar nessa salada mista de todas as influências na contemporaneidade e com perspectiva urbana tem levado alguns novos autores brasileiros a buscar no universo dos drop-outs e na marginalidade emocional - apagando a ''tradição'' populista e ideológica da marginalidade social da geração dos anos 60 e 70 - o espaço expressivo explorado pela dramaturgia inglesa, em especial Sara Kane e seus filhotes.

A explosão de Bosco Brasil com Novas diretrizes em tempos de paz, texto concentrado dramaticamente que, em montagem de 50 minutos, estabelece jogo de contrários com a simplicidade de climas emocionais e reflexão poética, não parece fato isolado ou sucesso circunstancial. A segurança, o rigor e a consistência de sua peça podem, igualmente, ser apontados em autores como Newton Moreno (Dentro) e Aimar Labaki (A boa). A generosidade criativa de Mário Bortolotto (Nossa vida não vale um Chevrolet), capaz de escrever dezenas de peças e criar condições de encená-las, estabelecendo em torno de sua obra uma circulação de idéias, constitui um efeito novo nas relações de um dramaturgo com a platéia. A verificar.

A dramaturgia de base literária, na qual a dramática segue estruturação narrativa linear, tem se mostrado menos consistente. Os concursos de dramaturgia oficiais revelam quadro assustador: produção volumosa, mas medíocre. Essa produção que deságua nos concursos parece concentrar livres atiradores que, sem técnica ou capacidade inventiva, produzem pastiches de Nelson Rodrigues às dezenas, requentam temas regionalistas e imaginam um ''teatro político'' sem contexto, quando não reduzem a diálogos primários aquilo que imaginam ser a estrutura de um texto teatral.

Nesta tradição mais literária, o aparecimento de Caio de Andrade (Os olhos verdes do ciúme) parece confirmar a sua vocação para a dramaturgia de contorno ''histórico'' e tradicionalista. Esse carioca, em meio a tantos paulistas, não está solitário nesse desvendamento atual das possibilidades de que surjam autores numa geografia teatral marcada pela cultura da comédia. O projeto Nova Dramaturgia Brasileira, que desde a última temporada, no Teatro Carlos Gomes, tenta acomodar e revelar aqueles que produzem no Rio, e que se inscrevem nesta nova onda dramatúrgica, integra-se à pressão de deixar nascer o que até então era um desejo condenado à memória dos computadores.

(Jornal do Brasil -14/01/2003)

21.1.03

PALHAÇOS EM ESPETÁCULO DE GALA

O Teatro Carlos Gomes neste sabado e domingo, reviveu os áureos tempos da Praça Tiradentes com um espetáculo de gala organizado pelo Teatro de Anônimo
para dar a largada para o Festival Anjos do Picadeiro 4, contando com a presença de um convidado internacional, o palhaço catalão "post-classic" Tortell Poltrona, considerado um dos melhores do mundo.

Não encontro palavras para dimensionar a arte desse artista maravilhoso. Não pela sua técnica ou pesquisas na contribuição ao circo moderno. Nada disso. Ele é simplesmente um palhaço, com todas aquelas performances manjadas dos palhaços do mundo todo. Mas a leveza, o brilho, a emoção que ele passa é única. Já tinha assistido o seu trabalho no Festival Anjos do Picadeiro 2 em São José do Rio Preto, e fiquei completamente fascinada. Ele leva a platéia ao delirio quando no final ele escolhe um amigo para homenagear e trocando de papel, se ajoelha para levar a maior torta em pleno rosto. Aqui no Rio, teve um numero novo, quando equilibrio pelo nariz dez cadeiras empilhadas. Simplesmente fantastico. Tem muitos anos de profissão, e além disso, é o fundador e presidente dos Palhaços sem Fronteiras, atuando em campos de refugiados e zonas depauperadas da Croacia, Bosnia, Republica Saharaui,entre outras, e vários países da América Latina.

Os incansáveis artistas do Anônimo, o João Carlos Artigos, a Angélica Gomes, o Marcio Libar, a Regina Oliveira, a Shirley Britto e a Flávia Berton -- os donos da festa, os que fazem e acontecem dentro e fora dos palcos, estão cada vez melhores, e mais afinados na sua arte. O João Carlos dançando naqueles passinhos miudinhos na melhor performance do malandro carioca, é demais.
E os quatro intrépidos da Intrépida Trupe fazendo aqueles numeros aéreos, voando literalmente por cima da cabeça das pessoas na platéia, causaram o maior frisson e encantamento.
Os atores do Centro Teatral ETC & Tal , o Alvaro Assad, Marcio Moura e Melissa Telles-Lobo com uma performance muito original mesclando mímica, teatro, circo numa invejável performance corporal.
E os três palhaços da Companhia do Público arrasaram como sempre. Adorei ver os Valdevinos de Oliveira -- o Leo, Fabinho e a Fabiana fizeram bonito contracenando com o Tortell. Que responsa. A Fuzarca da Lyra, com a parodia das musicas antigas, também foi muito aplaudida.

A prata da casa brilhou ao lado do ilustre convidado internacional. E o público que sabe das coisas lotou (voltou público da porta) o Carlos Gomes nos dois dias de apresentações, e aplaudiu deliramente esses maravilhosos artistas. Foram duas noites de gala com muita beleza, alegria, emoção. Uma festa de celebração à arte e à vida. E muito mais coisa.


Libera a grana, Prefeito!

Com esse espetáculo, foi dada a largada para a realização do Festival ANJOS DO PICADEIRO 4 que vai acontecer em dezembro, reunindo 250 artistas e 10 países. Esse festival estava programado para ser realizado em dezembro do ano passado, mas as verbas prometidas não sairam. E se não sairem aqui pelo Rio, periga acontecer em São Paulo ou Brasília. Os Anônimos já estão recebendo propostas. Se o prefeito César Maia pisar na bola, e essa verba não sair, o maior evento circense do País acontecerá mais uma vez fora do Rio.


18.1.03

ANJOS DO PICADEIRO EM NOITE DE GALA NO CARLOS GOMES

Programação
Sábado dia 18 - 20 hs. - Lançamento da Revista Anjos do Picadeiro 3

Recepção: VALDEVINOS DE OLIVEIRA

Primeira Parte: INTRÉPIDA TRUPE, TEATRO DE ANÔNIMO, CIA
DO PÚBLICO, FUZARCA DA LIRA e ETC E TAL.
Intervalo

Segunda Parte: ESPETÁCULO POST-CLASSIC com o palhaço espanhol Tortell Poltrona

Domingo dia 19 - 20 hs.

Recepção: VALDEVINOS DE OLIVEIRA

Abertura: INTRÉPIDA TRUPE

Espetáculo com CIRC CRIC, TORTELL POLTRONA, TEATRO DE ANONIMO e CIA DO PÚBLICO.

TEATRO CARLOS GOMES
Rua Pedro I nº 4 - Pça Tiradentes
TEL: 2232 8701
Ingressos: R$15,00 com filipeta R$10,00



Edmilson Santini conta cordel no Parque da Gávea

Contar história em cordel
vem da tradição oral,
ganhou fama em Portugal.
Da fala para o papel
manteve-se bem fiel
ao verso, à rima e à voz.
Até que aqui entre nós
teve sua evolução.
Prestem agora atenção:
Lá no Museu da Cidade
vai ter Cordel de verdade,
em bela apresentação.

É no dia dezenove,
verso rimado incendeia...
Compareça e comprove
domingo às onze e meia.



Parque da Cidade - Gávea.
Rua Santa Marinha, s/n.
Dia 19 de janeiro (neste domingo)
Horário: 11,30 hs.


BENVINDO SIQUEIRA ESTÁ DE VOLTA COM "O DOENTE IMAGINÁRIO"

O doente imaginário, de Molière, está de volta aos palcos. A comédia é dirigida por Jacqueline Laurence e tem o ator Bemvindo Siqueira no papel de Argan, o hipocondríaco. A história é a seguinte: a fim de passar o resto da vida cercado de médicos sem precisar desembolsar um tostão, ele tenta forçar a filha Angélica (Janaína Prado) a se casar com o doutor Diafoirus (Rogério Freitas), sobrinho de seu médico particular. A peça estreiou em agosto do ano passado no Teatro do Sesi, excursionou pelo sul, e agora voltou ao cartaz no mesmo teatro.

— Nesta peça, Molière ironiza, com o seu humor terrível, a medicina de seu tempo, que não era realmente nada. Os médicos eram charlatões que costumavam receitar sangrias e clister — diz Jacqueline, para quem o que há de mais atual na obra é a hipocondria de Argan. — A mania de doença e o ridículo a que as pessoas se expõem por causa disso é completamente atual.

A francesa Jacqueline, que já atuou em várias peças de Molière mas nunca havia dirigido uma, acredita que o fato de ter tido contato desde muito cedo com os textos do dramaturgo francês facilitou seu trabalho.

— Não me sinto perdida, lido com o texto com facilidade, não tenho problemas nem complexos — brinca Jacqueline, lembrando que esta montagem de “O doente imaginário”, traduzida por João Bethencourt e Bemvindo Siqueira, se resume à história em si. — Só no final incluímos uma das pantomimas.

O DOENTE IMAGINÁRIO De Molière. Direção: Jacqueline Laurence. Com Bemvindo Sequeira, Suely Franco e outros.

Teatro Sesi: Av. Graça Aranha 1, Centro — 2563-4163. Quinta, Sex e dom, às 19h30m. Sáb, às 20h30m. R$ 15 (qui), R$ 20 (sex e dom) e R$ 25 (sáb). 90 minutos.
Em tempo: Asistí a estréia e recomendo. Benvindo Siqueira em um dos melhores trabalhos da sua carreira, deita e rola -- literalmente -- no papel do hipocondriaco Argan. Não seria exagêro dizer que Benvindo deveria ter recebido um prêmio de ator por esta interpretação. Nunca tinha assistido nenhuma direção da Jacqueline
e foi uma grata surprêsa. Uma direção inteligente, segura, respeitando o texto de Molière, sem inventar nada.

17.1.03


Danças de Porão um dos dez melhores espetáculos do ano volta ao cartaz durante todo o mês de janeiro

O espetáculo de dança dos bailarinos e coreógrafos João Saldanha e Paula Nestorov volta ao cartaz no Paço Imperial - Sala dos Archeiros - durante todo esse mês de janeiro. Entrada franca. Espetáculo imperdível. Uma aula de dança,
uma aula de criação coreográfica. Um espetáculo de rara sensibilidade. Um dos melhores senão o melhor trabalho que eu tive a oportunidade de assistir no ano passado. Vou rever.

O espetáculo está na seleçao dos dez melhores espetáculos do ano pelo jornal OGlobo.


Uma exposição de passos

Reportagem de Adriana Pavlova (O Globo 29/12/2002)

Paula Nestorov e João Saldanha dançaram juntos uma única vez. Era meados dos anos 80 e a dupla de bailarinos ajudou a construir o espetáculo "Noturno", de Regina Miranda. Desde então, apesar das carreiras que seguiram paralelas, os dois sempre tiveram muitas conversas e afinidades. Pois esses encontros viraram a experiência coreográfica "Danças de porão" - que eles consideram uma exposição, não um espetáculo de dança - em cartaz no Paço Imperial.

- É um trabalho despretensioso, que nasceu da vontade de mostrarmos como é a criação coreográfica por dentro - avisa a tímida Paula, que promete conversar com a platéia em alguns momentos.

Para João, o encontro tem um sabor de retorno aos palcos, porque, há dez anos, ele tem ficado apenas nas coxias, como coreógrafo:

- Nós nos movimentamos mas não há construção coreográfica prévia. Na prática, trata-se de um diálogo de corpos bem diferentes.

DANÇAS DE PORÃO Os coreógrafos João Saldanha e Paula Nestorov mostram o avesso dos espetáculos, apresentam passos que revelam o processo de criação coreográfico.

Paço Imperial: Praça XV 48, Centro, Sala dos Archeiros — 2533-4401
Quintas e sextas , às 19h. Sábados e domingos, às 17h.
Entrada franca -- levar 1 quilo de alimento não perecível, se quiser.
(As senhas serão distribuídas com uma hora de antecedência). Até o final do mês corrente.

"Ela parece uma palhaça"

Essa ela aí sou eu. A frase eu ouvi durante a minha aula de expressão corporal para meninas adolescentes participantes de um projeto assistencial para menores infratores. Era tudo o que eu queria e precisava ouvir. Eu estou desenvolvendo um método próprio de trabalho misturando as técnicas de expressão corporal com técnicas teatrais e de clown com resultados muito animadores.

Durante o mês de janeiro os nosso alunos entram em férias, mas a FUNLAR mantém uma colonia de férias para crianças carentes e menores infratores. A grande maioria mora na comunidade vizinha da instituição -- o Morro dos Macacos. É um trabalho muito rico e estimulante. Um presente raro.

16.1.03




CEMITÉRIO OCUPA SÉRGIO PORTO


O dramaturgo paranaense Mário Bortolotto, diretor do grupo Cemitério de Automóves, um dos mais prolíficos dramaturgos brasileiros, radicado em São Paulo, com mais de 40 textos no currículo, ganhador do Prêmio Shell de 2.000 pelo espetáculo Nossa Vida não vale um Chevrolet e APCA pelo Conjunto da Obra, terá quatro de seus textos apresentados ao público carioca nos meses de Janeiro e Fevereiro (de 10 a 23 de fevereiro) no Espaço Sérgio Porto.
O Grupo conta hoje com cinco integrantes (Mário Bortolotto, Fernanda D´Umbra, Joeli Pimentel, Aline Abovsky e Wilton Andrade) e cerca de 70 atores agregados que sempre trabalham com o Grupo quando convidados. Para as apresentações no Rio de Janeiro o Grupo deve trazer ainda quatro desses agregados (Eucir de Souza, Laerte Mello, Gabriel Pinheiro e Francisco Eldo Mendes).

Em 2002 a atriz Fernanda D'Umbra produziu no Centro Cultural São Paulo a II Mostra de Teatro Cemitério de Automóveis com 26 espetáculos: 20 textos de Mário Bortolotto, cinco adaptações de grandes escritores da novíssima geração de contistas brasileiros (Marçal Aquino, Marcelo Mirisola, Reinaldo Moraes, Daniel Pellizzari e Daniel Galera) e um texto de Joeli Pimentel. A Mostra marcou ainda a estréia de Fernanda D'Umbra na direção com a adaptação do texto: Análise Comportamental e Crítica da Música Eduardo e Mônica. Desta Mostra participaram 80 atores paulistas.

A primeira edição da Mostra foi realizada em 2000, no mesmo espaço com produção também assinada por Fernanda D'Umbra onde foram encenados 13 textos de Mário Bortolotto e uma adaptação do romance Tanto Faz de Reinaldo Moraes. Da primeira edição participaram 40 atores.

Durante a temporada no Espaço Cultural Sérgio Porto o Grupo exibe quatro espetáculos de seu repertório, realiza uma oficina de interpretação com Mário Bortolotto e Fernanda D'Umbra e promove a leitura de três textos inéditos de Mário Bortolotto. As leituras terão entrada franca.


ESPETÁCULOS:

Nossa Vida não vale um Chevrolet - de 10 19 de janeiro.
A história dos Irmãos Castilho, ladrões de automóveis que se envolvem com a mesma mulher. (o espetáculo, Prêmio Shell de Melhor Texto em 2000 fechou a mais recente edição do Rio Cena Contemporânea).

Texto, direção, sonoplastia e iluminação: Mário Bortolotto.

Produção: Fernanda D'Umbra

Elenco: Fernanda D'Umbra, Mário Bortolotto, Francisco Eldo Mendes, Gabriel Pinheiro, Laerte Mello, Aline Abovsky, Pablo Perosa e Paulo Jordão.



Diário das Crianças do Velho Quarteirão - de 24 de janeiro a 2 de fevereiro
Jaime, um saxofonista loser e Álvaro, um desenhista de histórias em quadrinhos, são dois amigos politicamente incorretos que passam as tardes tomando cerveja e falando mal de tudo e de todos. A amizade vai ser abalada com a entrada em cena de Tati, uma street girl por quem os dois se apaixonam. (Este texto foi indicado ao Prêmio Shell de Melhor Texto em 1998, ano de sua estréia).

Texto, direção, sonoplastia e iluminação: Mário Bortolotto.

Produção: Fernanda D'Umbra

Elenco: Eucir de Souza, Fernanda D'Umbra e Mário Bortolotto.



Vamos Sair da Chuva quando a Bomba Cair - de 7 a 16 de fevereiro Ângela é uma jovem produtora bem sucedida, típica nova mulher, que tenta manter um relacionamento com Hassim, um vagabundo incondicional, que embora a ame, não parece disposto a mudar de vida. Ângela tenta a todo custo e em nome de sua felicidade, reverter a situação.

Texto, direção, sonoplastia e iluminação: Mário Bortolotto

Produção: Fernanda D'Umbra

Elenco: Fernanda D'Umbra e Mário Bortolotto

E éramos todos Thunderbirds - de 21 a 23 de fevereiro
Quatro traficantes de maconha, losers de carteirinha, não conseguem vender droga nenhuma porque consomem todo o produto que deveriam vender, passam os dias esparramados num sofá tomando cerveja e assistindo MTV. Estão revoltados com o fato de sua emissora preferida não passar mais vídeo clips. Sofrendo de crise de abstinência de vídeo clip, um deles seqüestra uma performer por confundi-la com a Cantora Madona.

Texto, direção, sonoplastia e iluminação: Mário Bortolotto

Produção: Fernanda D'Umbra

Elenco: Fernanda D'Umbra, Mário Bortolotto, Joeli Pimentel, Aline Abovsky, Wilton Andrade e João Fábio Cabral.


ESPAÇO CULTURAL SÉRGIO PORTO

Rua Humaitá, 163 - Humaitá -Tel 2266-0896

DE 10 DE JANEIRO A 23 DE FEVEREIRO DE 2003

SEXTA E SÁBADO - 21horas

DOMINGO - 20 horas Ingresso: Cinco Reais

OBS: Apresentando o canhoto do ingresso de qualquer espetáculo ou show realizado pela Rio Arte no período de 10 de janeiro a 23 de fevereiro - desconto de 50% para outro espetáculo.

OFICINA DE INTERPRETAÇÃO - GRATUITA

Mário Bortolotto e Fernanda D'Umbra ministram oficina de interpretação durante a temporada de seus espetáculos no Sérgio Porto. O Objetivo desta oficina é familiarizar os atores com a linguagem do Grupo Cemitério de Automóveis: interpretação realista, composição detalhada de personagens contemporâneos e urbanos.

Uma característica forte do Grupo é trabalhar com o palco vazio utilizando principalmente a relação dos atores com os elementos fundamentais da encenação: som, luz e espaço cênico. O ator dentro desta linguagem é co- autor da encenação porque imprime sua marca em um trabalho que depende basicamente de sua interpretação e da relação que ele estabelece com os outros atores, com a luz, o som e principalmente com o texto.

Com exercícios de texto e de improviso Mário e Fernanda conduzirão os alunos numa busca de personalidade em seus trabalhos de interpretação, aumentando seu domínio da cena e fugindo a toda velocidade dos clichês de interpretação.

A oficina será ministrada de quinta a domingo entre os dias 13 e 16 de fevereiro de 2003 no período das 15 às 18 horas no Espaço Cultural Sérgio Porto.

Público alvo: atores maiores de 18 anos com alguma experiência em teatro.

Seleção: não há critério de seleção, basta que se faça parte do público alvo.

Número de vagas: 20.

LEITURAS

Serão lidos três textos inéditos de Mário Bortolotto. Serão três quintas feiras de leituras com entrada franca sempre às 21 horas:

Dia 16/01 - O MÉTODO

Dia 30/01 - BRUTAL

Dia 13/02 - HOMENS SANTOS E DESERTORES


5.1.03



Repercussão do discurso do Gil

Na sua coluna de hoje em Oglobo, com o sugestivo título Vozes do Poder MÁRCIO MOREIRA ALVES, faz uma análise dos discursos dos ministros empossados, e destaca o do Ministro da Cultura como o mais original e inteligente.

(...)

Não subestime o Gil. Ele vai nos surpreender. É um homem muito inteligente e tem um diploma em administração”, disse-me Cacá Diegues, quando lhe manifestei receios de que o novo ministro da Cultura não fosse capaz ou não tivesse paciência para lidar com a burocracia do ministério.

A julgar pelo discurso de posse, Cacá tem razão. Foi o mais original e inteligente de um dia que teve 21 outros pronunciamentos. Gil, no seu discurso, fez uma definição abrangente do que seja cultura, que não cabe ao Estado fazer, como no modelo estatizante, mas clarear caminhos, abrir clareiras, estimular e abrigar. Disse Gil sobre o papel de seu ministério:

— Avivar o velho e atiçar o novo. A cultura brasileira não pode ser pensada fora desse jogo, dessa dialética permanente entre a tradição e a invenção, numa encruzilhada de matrizes milenares e informações e tecnologias de ponta. A política cultural deste ministério passa a ser vista como parte do projeto geral de construção de uma nova hegemonia no nosso país. Como parte e essência de um projeto consistente e criativo de radicalidade social. Como parte e essência da construção de um Brasil de todos. Temos de completar a construção da nação. De incorporar os segmentos excluídos. De reduzir as desigualdades que nos atormentam. Aqui será o espaço da abertura para a criatividade popular e para novas linguagens. O espaço da disponibilidade para a aventura e a ousadia. O espaço da memória e da invenção.


Belo programa. Difícil é pô-lo em prática

Oglobo 05/01/2003




Fragmentos de um discurso rigoroso




Entre os ministros que tomaram posse, Gilberto Gil talvez tenha feito o pronunciamento mais contundente e crítico em relação ao governo que saía, assim como foi também o que mais inovou em matéria de reflexão cultural e sociológica.


JOTABÊ MEDEIROS

Mais que seus novíssimos ternos Armani, é o estilo tropicalizante do novo ministro da Cultura que já se sobrepõe à paisagem igual e plana da Esplanada dos Ministérios. Na solenidade de transmissão do cargo, as palavras do cantor baiano ministro de Estado causaram espécie entre os circunstantes - nem tanto por seu conteúdo, mas muito mais pela forma, inusitada para os padrões palacianos.

Gil, no entanto, foi contundente na sua avaliação crítica e mostrou-se mais rigoroso do que foram alguns severos críticos da condução cultural da Era FHC. "O ministério não pode, portanto, ser apenas uma caixa de repasse de verbas para uma clientela preferencial", afirmou, sugerindo que sabe que existe uma "clientela preferencial", que a conhece e que ela deverá deixar de ser prioridade na sua gestão. Vai ser fácil medir essa promessa de inversão de prioridades já ao fim do primeiro ano.

Gil também foi duríssimo politicamente com o governo de Fernando Henrique (o qual tinha à sua esquerda um fiel representante, o ministro que saía), mas o "folclórico" (termo que ele condenou em seu discurso) pareceu se sobrepor à política no saldo final. "A pobreza até que diminuiu um pouco, como as estatísticas mostram. Mas, ao mesmo tempo, o Brasil se tornou um dos países mais desiguais do mundo. Um país que possui talvez a pior distribuição de renda de todo o planeta. E é esse escândalo social que explica, basicamente, o caráter que a violência urbana assumiu recentemente entre nós, subvertendo, inclusive, os antigos valores da bandidagem brasileira."

O discurso ainda antecipou medidas, planos e projetos. "Ao investir nas condições de criação e produção, estaremos tomando uma iniciativa de conseqüências imprevisíveis, mas certamente brilhantes e profundas", afirmou o cantor, anunciando o desejo de retomar a capacidade de investimento direto do Estado no setor.

"As políticas públicas para a cultura devem ser encaradas, também, como intervenções, como estradas reais e vicinais, como caminhos necessários, como atalhos urgentes", considerou o cantor-ministro. Sua própria auto-exigência consta do discurso. "Na verdade, o Estado nunca esteve à altura do fazer de nosso povo, nos mais variados ramos da grande árvore da criação simbólica brasileira." Gil parece prometer fazer com que o Estado chegue a esse nível de igualdade.

Moda na gestão Francisco Weffort, a reflexão sobre a "identidade nacional", que gerou diversos livros financiados pelo ministério, também compareceu na apresentação da era Gil. "E o que entendo por cultura vai muito além do âmbito restrito e restritivo das concepções acadêmicas, ou dos ritos e da liturgia de uma suposta 'classe artística e intelectual'. Cultura, como alguém já disse, não é apenas 'uma espécie de ignorância que distingue os estudiosos'."

O cantor, além de clamar por uma visão menos burocrática da questão cultural, também prometeu empenhar-se pessoalmente nisso - amparado em sua projeção internacional, seu trânsito fácil e a simpatia notória. "Sabemos que é preciso, em muitos casos, ir além do imediatismo, da visão de curto alcance, da estreiteza, das insuficiências e mesmo da ignorância dos agentes mercadológicos."

E o baiano também foi à política externa, ao embate com o espectro hegemônico da política internacional. "Sabemos que as guerras são movidas, quase sempre, por interesses econômicos. Mas não só. Elas se desenham, também, nas esferas da intolerância e do fanatismo. E, aqui, o Brasil tem lições a dar - apesar do que querem dizer certos representantes de instituições internacionais e seus porta-vozes internos que, a fim de tentar expiar suas culpas raciais, esforçam-se para nos enquadrar numa moldura de hipocrisia e discórdia, compondo de nossa gente um retrato interessado e interesseiro, capaz de convencer apenas a eles mesmos. Sim: o Brasil tem lições a dar, no campo da paz e em outros, com as suas disposições permanentemente sincréticas e transculturativas. E não vamos abrir mão disso", afirmou, peremptório.

Gil foi original no seu "do-in antropológico", barroco no seu "artefatos ou mentefatos", e também escorregou nos clichês mais batidos da área, como a expressão "não cabe ao Estado fazer cultura".

A questão maior é: sua disposição e demonstrada percepção do pepino cultural serão suficientes para levá-lo adiante ou apenas o colocarão em choque com seus pares do governo? Logo depois de fazer o seu discurso, Gil já tinha reuniões de gabinete com o pessoal do PT para o que seus assessores chamaram de "composição". Será isso a nomeação política de secretarias? Esse procedimento atende aos princípios enumerados na fala do ministro?

Caso seja assim, além do espaço para "aventura e a ousadia, a memória e a invenção", Gil precisará também acomodar o espaço da conveniência política, algo que não estava em seu discurso.


AE/Agencia Estado
O ESTADO DE SÃO PAULO
Sábado 04 de janeiro de 2003.








Já visitou o Artimanhas? É o meu blog pessoal. Visite-me ou se arrependerá para sempre.



Discurso de Gilberto Gil

A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva foi a mais eloqüente manifestação da nação brasileira pela necessidade e pela urgência da mudança. Não por uma mudança superficial ou meramente tática no xadrez de nossas possibilidades nacionais. Mas por uma mudança estratégica e essencial, que mergulhe fundo no corpo e no espírito do país. O ministro da Cultura entende assim o recado enviado pelos brasileiros, através da consagração popular do nome de um trabalhador, do nome de um brasileiro profundo, simples e direto, de um brasileiro identificado por cada um de nós como um seu igual, como um companheiro.


É também nesse horizonte que entendo o desejo do presidente Lula de que eu assuma o Ministério da Cultura. Escolha prática, mas também simbólica, de um homem do povo como ele. De um homem que se engajou num sonho
geracional de transformação do país, de um negromestiço empenhado nas movimentações de sua gente, de um artista que nasceu dos solos mais generosos de nossa cultura popular – e que, como o seu povo, jamais abriu mão da aventura, do fascínio e do desafio do novo. E é por isso mesmo que assumo, como uma das minhas tarefas centrais, aqui, tirar o Ministério da Cultura da distância em que ele se encontra, hoje, do dia-a-dia dos brasileiros.


Que quero o Ministério presente em todos os cantos e recantos de nosso País. Que quero que esta aqui seja a casa de todos os que pensam e fazem o Brasil. Que seja, realmente, a casa da cultura brasileira.


E o que entendo por cultura vai muito além do âmbito restrito e restritivo das concepções acadêmicas, ou dos ritos e da liturgia de uma suposta "classe artística e intelectual". Cultura, como alguém já disse, não é apenas "uma espécie de ignorância que distingue os estudiosos". Nem somente o que se produz no âmbito das formas canonizadas pelos códigos ocidentais, com as suas hierarquias suspeitas. Do mesmo modo, ninguém aqui vai me ouvir pronunciar a palavra "folclore". Os vínculos entre o conceito erudito de "folclore" e a discriminação cultural são mais do que estreitos. São íntimos. "Folclore" é tudo aquilo que – não se enquadrando, por sua antigüidade, no panorama da cultura de massa – é produzido por gente inculta, por "primitivos contemporâneos", como uma espécie de enclave simbólico, historicamente atrasado, no mundo atual. Os ensinamentos de Lina Bo Bardi me preveniram definitivamente contra essa armadilha. Não existe "folclore" – o que existe é cultura.


Cultura como tudo aquilo que, no uso de qualquer coisa, se manifesta para além do mero valor de uso. Cultura como aquilo que, em cada objeto que produzimos, transcende o meramente técnico. Cultura como usina de símbolos de um povo. Cultura como conjunto de signos de cada comunidade e de toda a nação. Cultura como o sentido de nossos atos, a soma de nossos gestos, o senso de nossos jeitos.


Desta perspectiva, as ações do Ministério da Cultura deverão ser entendidas como exercícios de antropologia aplicada. O Ministério deve ser como uma luz que revela, no passado e no presente, as coisas e os signos que fizeram e fazem, do Brasil, o Brasil. Assim, o selo da cultura, o foco da cultura, será colocado em todos os aspectos que a revelem e expressem, para que possamos tecer o fio que os unem.


Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, criar condições de acesso universal aos bens simbólicos. Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, proporcionar condições necessárias para a criação e a produção de bens culturais, sejam eles artefatos ou mentefatos. Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, promover o desenvolvimento cultural geral da sociedade. Porque o acesso à cultura é um direito básico de cidadania, assim como o direito à educação, à saúde, à vida num meio ambiente saudável. Porque, ao investir nas condições de criação e produção, estaremos tomando uma iniciativa de conseqüências imprevisíveis, mas certamente brilhantes e profundas – já que a criatividade popular brasileira, dos primeiros tempos coloniais aos dias de hoje, foi sempre muito além do que permitiam as condiçõs educacionais, sociais e econômicas de nossa existência. Na verdade, o Estado nunca esteve à altura do fazer de nosso povo, nos mais variados ramos da grande árvore da criação simbólica brasileira.


É preciso ter humildade, portanto. Mas, ao mesmo tempo, o Estado não deve deixar de agir. Não deve optar pela omissão. Não deve atirar fora de seus ombros a responsabilidade pela formulação e execução de políticas
apostando todas as suas fichas em mecanismos fiscais e assim entregando a política cultural aos ventos, aos sabores e aos caprichos do deus-mercado. É claro que as leis e os mecanismos de incentivos fiscais são da maior importância. Mas o mercado não é tudo. Não será nunca. Sabemos muito bem que em matéria de cultura, assim como em saúde e educação, é preciso examinar e corrigir distorções inerentes à lógica do mercado – que é sempre regida, em última análise, pela lei do mais forte. Sabemos que é preciso, em muitos casos, ir além do imediatismo, da visão de curto alcance, da estreiteza, das insuficiências e mesmo da ignorância dos agentes mercadológicos. Sabemos que é preciso suprir as nossas grandes e fundamentais carências.


O Ministério não pode, portanto, ser apenas uma caixa de repasse de verbas para uma clientela preferencial. Tenho, então, de fazer a ressalva: não cabe ao Estado fazer cultura, a não ser num sentido muito específico e inevitável. No sentido de que formular políticas públicas para a cultura é, também, produzir cultura. No sentido de que toda política cultural faz parte da cultura política de uma sociedade e de um povo, num determinado momento de sua existência. No sentido de que toda política cultural não pode deixar nunca de expressar aspectos essenciais da cultura desse mesmo povo. Mas, também, no sentido de que é preciso intervir
Não segundo a cartilha do velho modelo estatizante, mas para clarear caminhos, abrir clareiras, estimular, abrigar. Para fazer uma espécie de "do-in" antropológico, massageando pontos vitais, mas momentaneamente desprezados ou adormecidos, do corpo cultural do país. Enfim, para avivar o velho e atiçar o novo. Porque a cultura brasileira não pode ser pensada fora desse jogo, dessa dialética permanente entre a tradição e a invenção, numa encruzilhada de matrizes milenares e informações e tecnologias de ponta.


Logo, não se trata somente de expressar, refletir, espelhar. As políticas públicas para a cultura devem ser encaradas, também, como intervenções, como estradas reais e vicinais, como caminhos necessários, como atalhos urgentes. Em suma, como intervenções criativas no campo do real histórico e social. Daí que a política cultural deste Ministério, a política cultural do Governo Lula, a partir deste momento, deste instante, passa a ser vista como parte do projeto geral de construção de uma nova hegemonia em nosso País. Como parte do projeto geral de construção de uma nação realmente democrática, plural e tolerante. Como parte e essência de um projeto consistente e criativo de radicalidade social. Como parte e essência da construção de um Brasil de todos.


Penso, aliás, que o presidente Lula está certo quando diz que
a onda atual de violência, que ameaça destruir valores essenciais da formação de nosso povo, não deve ser creditada automaticamente na conta da pobreza. Sempre tivemos pobreza no Brasil, mas nunca a violência foi tanta como hoje. E esta violência vem das desigualdades sociais. Mesmo porque sabemos que o que aumentou no Brasil, nessas últimas décadas, não foi exatamente a pobreza ou a miséria. A pobreza até que diminuiu um pouco, como as estatísticas mostram. Mas, ao mesmo tempo, o Brasil se tornou um dos países mais desiguais do mundo. Um país que possui talvez a pior distribuição de renda de todo o planeta. E é esse escândalo social que explica, basicamente, o caráter que a violência urbana assumiu recentemente entre nós, subvertendo, inclusive, os antigos valores da bandidagem brasileira.


Ou o Brasil acaba com a violência, ou a violência acaba com o Brasil. O Brasil não pode continuar sendo sinônimo de uma aventura generosa, mas sempre interrompida. Ou de uma aventura só nominalmente solidária. Não pode continuar sendo, como dizia Oswald de Andrade, um país de escravos que teimam em ser homens livres. Temos de completar a construção da nação. De incorporar os segmentos excluídos. De reduzir as desigualdades que nos atormentam. Ou não teremos como recuperar a nossa dignidade interna, nem como nos afirmar plenamente no mundo. Como sustentar a mensagem que temos a dar ao planeta, enquanto nação que se prometeu o ideal mais alto que uma coletividade pode propor a si mesma: o ideal da convivência e da tolerância, da coexistência de seres e linguagens múltiplos e diversos, do convívio com a diferença e mesmo com o contraditório. E o papel da cultura, nesse processo, não é apenas tático ou estratégico – é central: o papel de contribuir objetivamente para a superação dos desníveis sociais, mas apostando sempre na realização plena do humano.


A multiplicidade cultural brasileira é um fato. Paradoxalmente, a nossa unidade de cultura – unidade básica, abrangente e profunda – também. Em verdade, podemos mesmo dizer que a diversidade interna é, hoje, um dos nossos traços identitários mais nítidos. É o que faz com que um habitante da favela carioca, vinculado ao samba e à macumba, e um caboclo amazônico, cultivando carimbós e encantados, sintam-se – e, de fato, sejam – igualmente brasileiros. Como bem disse Agostinho da Silva, o Brasil não é o país do isto ou aquilo, mas o país do isto e aquilo. Somos um povo mestiço que vem criando, ao longo dos séculos, uma cultura essencialmente sincrética. Uma cultura diversificada, plural – mas que é como um verbo conjugado por pessoas diversas, em tempos e modos distintos. Porque, ao mesmo tempo, essa cultura é una: cultura tropical sincrética tecida ao abrigo e à luz da língua portuguesa.


E não por acaso me referi, antes, ao plano internacional. Tenho para mim que a política cultural deve permear todo o Governo, como uma espécie de argamassa de nosso novo projeto nacional. Desse modo, teremos de atuar transversalmente, em sintonia e em sincronia com os demais ministérios. Alguns dessas parcerias se desenham de forma quase automática, imediata, em casos como os dos ministérios da Educação, do Turismo, do Meio Ambiente, do Trabalho, dos Esportes, da Integração Nacional. Mas nem todos se lembram logo de uma parceria lógica e natural, no contexto que estamos vivendo e em função do projeto que temos em mãos: a parceria com o Ministério das Relações Exteriores. Se há duas coisas que hoje atraem irresistivelmente a atenção, a inteligência e a sensibilidade internacionais para o Brasil, uma é a Amazônia, com a sua biodiversidade – e a outra é a cultura brasileira, com a sua semiodiversidade. O Brasil aparece aqui, com as suas diásporas e as suas misturas, como um emissor de mensagens novas, no contexto da globalização.


Juntamente com o Ministério das Relações Exteriores, temos de pensar, modelar e inserir a imagem do Brasil no mundo. Temos de nos posicionar estrategicamente no campo magnético do Governo Lula, com a sua ênfase na afirmação soberana do Brasil no cenário internacional. E sobretudo temos de saber que recado o Brasil – enquanto exemplo de convivência de opostos e de paciência com o diferente – deve dar ao mundo, num momento em que discursos ferozes e estandartes bélicos se ouriçam planetariamente. Sabemos que as guerras são movidas, quase sempre, por interesses econômicos. Mas não só. Elas se desenham, também, nas esferas da intolerância e do fanatismo. E, aqui, o Brasil tem lições a dar – apesar do que querem dizer certos representantes de instituições internacionais e seus porta-vozes internos que, a fim de tentar expiar suas culpas raciais, esforçam-se para nos enquadrar numa moldura de hipocrisia e discórdia, compondo de nossa gente um retrato interessado e interesseiro, capaz de convencer apenas a eles mesmos. Sim: o Brasil tem lições a dar, no campo da paz e em outros, com as suas disposições permanentemente sincréticas e transculturativas. E não vamos abrir mão disso.


Em resumo, é com esta compreensão de nossas necessidades internas e da procura de uma nova inserção do Brasil no mundo que o Ministério da Cultura vai atuar, dentro dos princípios, dos roteiros e das balizas do projeto de mudança de que o presidente Lula é, hoje, a encarnação mais verdadeira e mais profunda. Aqui será o espaço da experimentação de rumos novos. O espaço da abertura para a criatividade popular e para as novas linguagens. O espaço da disponibilidade para a aventura e a ousadia. O espaço da memória e da invenção.
Muito obrigado.

(Este blog agradece comovido ao Marinildadas, blog da minha amiga blogueira, a jornalista Marinilda Carvalho que conseguiu o furo. A cobertura mais completa da posse de Lula está lá nesse blog. Visita obrigatória).





Discurso de Gil é sucesso

Objetivo é fazer do ministério 'a casa da cultura popular'

Leandro Fortes (Jornal do Brasil)



Agência Brasil

Gilberto Gil


BRASÍLIA - De paletó e gravata e unhas de cerâmica na mão direita, justo a que usa para dedilhar o violão, Gilberto Gil subiu no palco do Ministério da Cultura às 15h em ponto de ontem. Diante de uma platéia basicamente formada de artistas e agentes culturais, Gil fez da cerimônia um raro show de lirismo político. O discurso do compositor baiano, cheio de figuras de linguagens, neologismos e engajamento social, conseguiu arrancar aplausos e teve um toque diferente em relação às demais cerimônias de posse. Em nove laudas, Gil girou sua bússola cultural para a luta contra a violência e pela inserção dos excluídos sociais nos planos da pasta.
No auditório lotado onde foi empossado, Gil desconstruiu com sutileza toda a história do Ministério da Cultura até aquele momento, o que provocou um desconforto quase físico em Francisco Weffort, o ministro que saía.

Ato contínuo, no pior momento da cerimônia, Weffort teve a péssima idéia de acender um charuto na mesa de autoridades. A platéia, espremida e atônita, começou a tossir em protesto. Gil passou a ler ainda mais calmamente o texto do discurso enquanto, constrangido, o ex-ministro se viu obrigado apagar o charuto e a escondê-lo num cinzeiro, sob a mesa.

Contraponto ao longo e burocrático discurso de despedida de Weffort, a fala de Gil enveredou pelos floreios e pela crítica direta - mas elegante. Ele se autodenominou um ''negro mestiço'' para falar do sonho de sua geração e da tarefa de fazer do ministério uma casa da cultura popular. Criticou a ferocidade do ''deus-mercado'' e prometeu acabar com a distância que, segundo ele, separa a pasta da Cultura do dia-a-dia dos brasileiros.

- Desta perspectivas, as ações deverão ser entendidas como exercícios de antropologia aplicada - disse.

Na primeira fileira, o senador baiano eleito Antônio Carlos Magalhães (PFL) era mais um numa platéia que, aos poucos, foi sendo dominada pelo ritmo do discurso. Gil disse que pretende se posicionar estrategicamente no ''campo magnético'' do governo Lula, e que o ''escândalo social'' provocado pela má distribuição de renda no país está na origem da violência.

- Isso explica, basicamente, o caráter que a violência urbana assumiu recentemente entre nós, subvertendo, inclusive, os antigos valores da bandidagem brasileira - disse Gil, arrancando risadas.

Ele disse que pretende rever a ações do ministério, inclusive a lei de incentivos fiscais - a chamada Lei Rouanet - mudando a política de investimentos no setor cultural. Prometeu voltar-se para os setores populares e tirar das grandes empresas e dos centros desenvolvidos a primazia sobre os financiamentos culturais.

- Aqui será o espaço da memória e da invenção. Viva o povo brasileiro! - bradou Gil ao terminar o discurso.

Jornal do Brasil
[03/JAN/2003]